sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Aos que brilham no anonimato.

Em que momento nos perdemos dos nossos sonhos? 



Pode soar como uma baita falta de educação. Mas, aqui no Rio de janeiro, é muito comum entrarmos num taxi quando o último passageiro mal terminou de descer. Não é pra menos, a cidade tem uma das maiores frotas do mundo e o custo/benefício faz com que esse meio de transporte seja uma opção para a maioria das classes. E a correria da vida deixa os cariocas, um tanto quanto, afoitos: não querem ter a impressão de que estão perdendo o dia com protocolos inúteis.

Foi o que fiz. Tão logo entrei no taxi em Copacabana rumo à Ipanema e o taxista se prontificou:

__Você não viu quem acabou de descer?

Fiz uma cara de quem não estava entendendo e ele continuou:

__Aquele cara que fez um filme da favela, que tem o pessoal do Bope, esqueci o nome dele...
__Wagner Moura.

__Isso, ele mesmo! Precisava ver, é uma pessoa normal como nós, muito simples, gente boa. Ele conversou comigo de igual pra igual, acredita?

Fiquei matutando aquele incidente na cabeça. Será que ele imaginou que o Wagner Moura entraria no seu taxi com um fuzil gritando:

__Segue aquele carro!

E daí entrariam numa aventura mirabolante com direito a troca de tiros, perseguição, adrenalina no sangue, suor artificial protegido por uma maquiagem com direito a Photoshop e tudo mais?  O Wagner Moura é normal, a Xuxa é total normal e, o Obama é mais normal ainda – pra não dizer sem sal.

Paulo Coelho não ficaria no banco de trás citando versículos de autoajuda, Rihanna jamais perderia seu tempo dando uma palhinha ‘like I’m the only girl the world’, Sabrina Sato jamais ousaria vestir a fantasia de panicat repetindo ‘Oi, gente’, com a cabecinha curvada pro lado. Essas pessoas, na maioria das vezes, têm a vida corrida como a nossa. Estão preocupadas com suas despesas pessoais, com as cobranças ou, faltas amorosas. Sentem fome de amor, sede de reconhecimento que nenhum holofote consegue reproduzir, temem a velhice, a solidão. Foi se o tempo em que celebridades eram mitos, sem acesso às suas intimidades. Hoje soltam um pum e os comentários respingam na nossa timeline do Facebook.

A sociedade assassinou gerações quando divulgava a felicidade artificial sem dizer o que estava por trás de tudo isso, mostrando apenas celebridades com um corpo impecável, vestindo grifes milionárias, com sorrisos intactos no estilo: eu vivo em plena alegria, você não.

Felizmente, essa nossa condição de plateia tem caído por terra a cada dia.  As pessoas estão mais espertas e entendendo que nem sempre quem está no palco é digno de aplausos. Sem tirar o merecimento das nossas grandes personalidades, mas será que eles são realmente os melhores no que fazem?

N-Ã-O!

Tive a oportunidade de trabalhar com uma jornalista que escrevia como ninguém. Com muita facilidade redigia algumas linhas sobre qualquer coisa e pronto, você ficava ali, extasiado: “O que você está fazendo aqui, perdida nesse escritório?”, pensava comigo. Mas ela estava mais preocupada com esse lance todo de alma gêmea, encontrar o cara ideal, e isso consumia a maior parte do seu tempo livre. Estava focada na sua paz de espírito.

Outra pessoa fenomenal foi uma chefe que tive: uma francesa com jeitinho brasileiro. Tinha o savoir faire parisiense e o bom humor carioca, uma mistura estupenda. Uma mulher finíssima, com elegância nas atitudes (Chegava a pedir permissão para nos dirigir a palavra), sempre com um sotaque gostoso de ouvir, movimentos leves, um sorriso largo e um olhar penetrante que passava confiança. O que uma mulher tão linda, chique, de família abastada, estava fazendo naquele hotel cinco estrelas de Copacabana?

Existe também um rapaz na academia que rouba a cena quando vai treinar. É impressionante o seu magnetismo, carisma, a forma como trata desde a menina da faxina aos seus companheiros de treino, sem qualquer diferença. O seu corpo é de dar inveja, está com seus vinte e tantos, é bem articulado, tem um sorriso perfeito e olhos azuis da cor de uma pedra Safira, que ficam ainda mais realçados quando ele decide aparecer bronzeado: não, não curto muito esse lance de modelo, nem levo jeito pra televisão. É a resposta que ele tem na ponta da língua.

Todas essas pessoas, com suas qualidades, quase que invisíveis, simplesmente optaram pelo anonimato e estão brilhando no backstage como jornalistas, médicos, profissionais de educação física, cabelereiros, diaristas. Estão cumprindo o seu papel da melhor forma, tomando taxi como meros normais, seguindo suas vidas sem a obsessão de serem reconhecidos, sem a menor intenção de provar ao mundo o talento que corre em suas veias. Estão com outras prioridades na cabeça.

É certo que algumas fatalidades nos tiram da nossa trajetória, do tão sonhado plano em tornar-se num músico, por exemplo. A gente descobre que não dá dinheiro, que o nosso país valoriza mais bundas do que os donos delas, que vai precisar cantar de graça por muito tempo... E, então, as contas se empilham; os pais insistem na cobrança: ‘é melhor estudar pra concurso’, e você se envereda por outro caminho se transformando em algo que nunca quis porque precisava satisfazer os outros: bem vindo ao mundo real. A música vira, no máximo, um hobby e você fica com o gostinho do reconhecimento engasgado, acreditando que não é tão bom quanto os que estão no palco.

Se o seu desejo é ser músico, ou, seja lá o que for, trace objetivos, vá atrás, porque a lamentação é angustiante e consome grande parte da nossa juventude. É preciso ter capacidade de surpreender a autoconfiança, entender que nem todos terão as mesmas oportunidades (alguns drasticamente terão mais sorte do que outros), e não há necessidade de revoltar-se contra isso. O nosso brilho deve vir da alma, e o sucesso não depende de plateia, mas da nossa aptidão de colocar em prática o que fazemos de melhor.


Bruno de Abreu Rangel





terça-feira, 6 de janeiro de 2015

O mínimo que você precisa saber antes de desistir de um relacionamento.



Um pedaço de papel;
Um carimbo de firma reconhecida;
Dois anéis;
E um padre no meio pra dizer Amém.
Isso é casamento – não amor.

Amar não é algo tão simples como parece.  Passamos toda uma existência buscando porto seguro nos relacionamentos, terra firme no coração de terceiros e exigindo do nosso parceiro uma solidez decretada numa cerimônia que não passa de um ritual.

Quando mergulhamos na realidade sabemos que é preciso ter coragem para dominar o medo do tédio, da rotina que ganha espaço a cada dia, do sexo que passa de paixão à obrigação como num passe de mágicas, da falta de novidades que acorda o monstro da inquietação. Temos a necessidade de sermos surpreendidos o tempo todo e quando menos esperamos nos pegamos flertando com o proibido, querendo provar o sabor de outra primeira vez, ser desejado como um adolescente à flor da pele cuja vida se resume em (babado – confusão e gritaria).

E onde foram parar as juras de amor eterno, aquela paixão do último capítulo de novela que rendeu inúmeras fotos nas redes sociais? Em que momento as pessoas se perdem umas das outras?
A falta de desafios mata uma relação de pouco em pouco, como um conta-gotas. E de uma hora pra outra vemos tudo desaparecer na nossa frente. E, ao invés de agirmos com sabedoria, estragamos tudo de uma vez por todas, trocando ofensas e sujando as nossas mãos com atitudes imperdoáveis.

Quantas histórias não se desfazem porque o vaso da sala quebrou; porque alguém cometeu o erro de curtir uma foto de algum desinibido sem camisa; ou, porque mensagens trocadas no Whatsapp vieram à tona? Hoje, é preciso de pouco para que duas pessoas desistam de seguir adiante. Todos os dias a vida vai nos oferecer inúmeros motivos e alternativas para deixarmos o nosso amor em troca de uma ilusão. O cartório e a igreja perderam espaço e sobrou apenas um contrato que pode ser desfeito a qualquer instante, sem muita cerimônia. Os dois irão se afastar, os amigos se aproximarão passando as mãos na cabeça, ‘Relaxa amigo, você vai encontrar alguém que te valorize’, o mesmo discurso das nossas mães superprotetoras que sempre nos mimaram com a lavagem cerebral de que merecemos o melhor e que ninguém é suficiente.

Então basta que uma das partes se aborreça e trocamos de cama com uma velocidade maior do que se trocam os lençóis. Trocamos de casa, as pessoas que vivem nela e voltamos ao ponto de partida, repetindo o mesmo ciclo que é basicamente assim:

Você conhece uma pessoa, vive alguns instantes que comprovam as afinidades. O sexo é forte, frenético e vai de amorzinho à selvagem numa facilidade louca. Você se sente adolescente quando já é adulto e se sente adulto quando é adolescente. O cheiro hipnotiza, o toque da pele chega a dar arrepios na espinha, os defeitos são insignificantes, as qualidades nos fascinam, as conversas fluem e são pra lá de prazerosas. Você descobre no decorrer da convivência que ele faz um risoto ao funghi como ninguém, que ele já viajou meio mundo, sabe trocar a maçaneta da porta, tem qualidades que seu ex jamais sonhara ter. É novidade atrás de novidade. ‘Por onde você andou esse tempo todo?’.

Sendo bastante otimista, toda essa fantasia vai durar uns dois anos, no máximo.

Na etapa seguinte, vem o comprometimento. A grande maioria das pessoas, nos dias de hoje, não chega nem próximo dessa fase onde acontece o casório ou o ‘Traga um pouco de roupas, separei uma gaveta pra você’. Começam-se o planejamento dos sonhos, a demarcação de território, o “Você me pertence”,os apelidos fofos que vêm acompanhados com vozinhas de bebê. Estabelecem-se as regras (o relacionamento pode ser careta, tradicional, um pouco moderno e até com dois hambúrgueres, alface, queijo e molho especial – desde que você volte pra casa). É nesse estágio que surgem as melhores viagens, o apego ao círculo de amizades do outro, o aval da família ou a negação forever. O sexo não é mais um Cirque de Soleil, não há muitos malabarismos, poucos improvisos, tudo um pouco premeditado. Ainda que numa roda de amigos os outros casais digam que fazem amor loucamente todos os dias, você ri por dentro e sabe que estão mentindo, e nem se incomoda muito com isso porque o vínculo e a instituição família é que está em jogo.

Só o amor não é o suficiente. É a etapa da intolerância, da tendência à autodestruição, do silêncio incômodo em frente à TV, dos assuntos repetitivos, das críticas por bobagens, da desconfiança desnecessária, do ciúme exagerado (que é o medo de perder dando sinal de vida), do sexo de vez em nunca, do perdão de mentirinha que ressurge com cobranças ainda mais caras, da falta de pequenos gestos, dos elogios que caíram no marasmo, da economia de afetos, do romance que ficou trancado numa gaveta cuja chave se perdeu entre tantas outras coisas. E então surgem os pontos de interrogação, os questionamentos internos, as faltas que surgiram na infância e que empurramos pra baixo do tapete a vida inteira “Outra hora limpo isso” e resolvemos vomitar as nossas frustrações e dar um ponto final porque a nossa história de amor não é mais um conto de fadas.

E o tempo exato pra esquecer alguém... Não dá pra estimar: um dia, um mês, um ano, uma eternidade que poderá nos render boas terapias. Não vamos morrer por isso, ao menos fisicamente. Se você é daqueles que supera uma perda com facilidade: nota 10 pra você, mas como qualquer ser humano não vai escapar do processo de recuperação do amor próprio fazendo dietas mirabolantes, passando horas na academia desafiando os limites do corpo, usando cremes caríssimos pra rejuvenescer a pele, buscando apoio nos amigos, nas drogas sintéticas (tomando algumas balas a mais pra colorir a vida com cores que você não consegue mais enxergar), transando com o maior número de pessoas porque a sua presença não é suficiente e entrando na paranoia de que qualquer desavisado que cruza o seu caminho lhe trará a mesma segurança de antes.  

Afinidade – comprometimento – intolerância. Isso é o mínimo que deveríamos saber antes de desistirmos de um relacionamento. Vai acontecer novamente, seja com quem for, como num ciclo interminável. Ninguém é obrigado a ficar com alguém que não lhe traga paz de espírito, mas se a gente der vazão à inquietude passaremos a vida experimentando amores instantâneos, destruindo sonhos na mesma velocidade da luz e criando expectativas cada vez mais virtuais, sem fundamentos e com pouca estabilidade emocional. E sim, a vida é curta e a fila anda, mas como já dizia William Shakespeare, “É comum perder-se o bom por querer o melhor”.


Bruno de Abreu Rangel