Quem já leu o
livro A coragem de ser você mesmo,
deve ter associado o título logo de cara. Eu li e reli a obra, de cabo a rabo,
pra tentar assimilar os ensinamentos de Osho, que me deixavam boquiaberto a
cada página devorada. Numa de suas passagens mais marcantes ele nos convida a
refletir: nossos pais nos falaram sobre Deus, e o que eles sabem sobre Deus?
Qual a experiência que tiveram?
O mestre na
arte da meditação matou a charada, estamos repetindo padrões de gerações. Os
pais impossibilitam os seus filhos de investigarem sobre a própria existência,
tirando-lhes a chance de descobrirem quem são: você é batizado se nasce num lar
cristão, circuncisado se tem origem judaica, matriculado numa escola trilíngue
se é filho de diplomatas. E nada disso lhe foi perguntado. Quando você cresce
se sente uma carta fora do baralho, vivendo uma vida que não é sua, com a
cabeça encalacrada de perguntas existenciais.
E é bem por
aí. Com o passar dos anos nos tornamos numa pessoa cheia de pré-conceitos, com
uma penca de inverdades e uma merrequinha de coragem para aceitar o nosso “Eu” que
fica entalado na garganta, porque o mundo não tem o menor interesse em saber
sobre nós.
Assim acontece
com a maioria das pessoas que se descobrem gays, por exemplo. Elas crescem
sendo induzidas ao matrimônio tradicional, a seguir todo o ritual como manda a
apostila dos bons modos, são adestradas a entender que futebol é esporte de
macho e romantismo é coisa da ala feminina. E na maioria dos casos, a firmeza
de espírito para enfrentar uma situação emocionalmente complicada vem com os
primeiros fios de cabelo branco, para alguns nem vêm, pois o preço é alto – e
não estou falando apenas de sexualidade, mas do esforço para olhar-se no
espelho da alma sem se intimidar com o que vê. A vida sem maquiagem é muito
mais interessante, mais natural, mais leve.
Somos
condicionados o tempo todo e o segredo pra fugir do sistema é fazer as malas e
embarcar numa aventura sem volta para o autoconhecimento. Talvez quando criança
a casa dos seus pais fosse azul e por esse motivo você se apaixona por tudo que
tem a cor do céu; de repente, em algum momento, você admirou alguém de pele morena
e hoje tem uma queda por pessoas dessa natureza; na adolescência assistiu a um
documentário sobre proteger vidas e decidiu tornar-se num policial porque
adrenalina e senso de defesa estão no seu DNA; existem também as tristezas
pessoais, os traumas que a gente esconde do Facebook
e mantêm guardados numa caixinha com o receio de que alguém um dia descubra
nossas fraquezas: assim somos nós na íntegra – versão sem cortes.
A parte boa
de amadurecer é ter a desenvoltura de sermos nós mesmos, autonomia para assumir
o nosso papel sem fazer teatro, sentar numa mesa de bar apenas com pessoas que
nos acrescentam sem precisar ficar naquela mise-en-scène toda (função de fazer
sala com sorrisos ensaiados), considerar que é uma grande bobagem gastar a voz
com indivíduos que estão em outra sintonia, reconhecer que em alguns momentos
teremos pensamentos insanos, pontadas de ciúme, surtos de inveja, crises de
amor-próprio, um medo de fazer xixi nas calças por motivos tolos, dúvidas e
indecisões que vão nos manter acesos nas madrugadas em que todos estão com as
luzes apagadas. “O importante é ser você, mesmo que seja bizarro, seja você”. É
verdade Pitty, também estamos nessa pegada.
Da meditação
ao rock a mensagem é a mesma: desprendimento, aceitação e liberdade, que vem
com um leque de aprendizados. Pra ser mais feliz é preciso coragem, valentia
pra ligar aquele botãozinho do *oda-se e escutar de fato o que a nossa alma
pede. Os tempos são outros e a evolução espiritual vai muito além do que as
pessoas pensam sobre nós.
Bruno de Abreu
Rangel