Falta da instituição família e
rejeição social... Será?
Utilizo o metrô como meio de
transporte desde sempre. Além de achar mais rápido, prático e seguro é uma
fonte enriquecedora para as minhas inspirações, uma amostra do comportamento
humano dentro de um vagão. Um entra e sai de gente de todo tipo que está se
deslocando para o trabalho, para casa, ou pra algum lugar que vai distraí-lo da
mesmice da vida.
Um fato interessante que me
chamou atenção no meu último trajeto Centro-Ipanema foi uma conversa entre dois
rapazes que confidenciavam sobre suas vidas em alto e bom tom, pra quem
quisesse ouvir. Era como se tivessem ligado o “fod*-se” para a opinião alheia.
Ponto pra eles e pra quem consegue levar a vida com esse desprendimento.
O maior barato do bate papo
foi quando um deles disse que tinha sido expulso de casa por ter contado aos
pais que era homossexual. O outro deu risadas e prosseguiu:
__Expulso de casa? Isso é
tão anos oitenta. A senhora deve ter sido expulsa porque está surtando.
Algumas pessoas que estavam
próximas riram juntas, inclusive eu. Senso de humor apurado é algo que me
fascina. Pelo jeito que eles se comunicavam no feminino, sempre caçoando um do
outro, deu pra perceber o grau de intimidade que eles tinham: uma amizade de
longa data.
__Surtada eu, está louca? Quem
gasta o salário todo aqui com festas é a senhora, tá meu bem? Defendeu-se
contorcendo o corpo de forma que me fez lembrar a Vanessão (20 reais). Pra quem
não conhece vale uma navegada pelo Youtube.
E então continuaram com o
diálogo que, algumas vezes, chocava uma senhora que estava escorada na porta
apertando um livro contra o peito, emitindo uns tsc tsc tsc, balançando a
cabeça de forma negativa e esperando algum olhar de aprovação para formar a
turma dos “eles não são como nós”, que pra sua infelicidade não aconteceu.
Conversa vai, conversa vem e
o assunto fica sério. Como num estalar de dedos a verdade veio à tona:
__ Amiga, a senhora foi
expulsa de casa porque não quer ajudar a família com as despesas e da noite para
o dia me aparece no Facebook fazendo check in na Grécia. Como assim viado?
Desde que a senhora descobriu o Stanazolol está pagando Mykonos, e agora se faz de bicha coitada abandonada pelos pais,
pronto falei!
Não sei se tudo foi dito
exatamente com essas palavras, mas resumi ao máximo que pude. Tudo o que eu me
lembro é que ele realmente deu um baita choque de realidade no amigo.
É bem verdade que os nossos
pais têm uma parcela de culpa quando decidimos abandonar o nosso lar pra vivermos
a vida que julgamos merecer porque no fundo da nossa alma gostaríamos que fosse
diferente, que eles nos apresentassem uma estrutura familiar onde ser gay
tivesse o seu lugar na árvore genealógica sem que nos considerassem extraterrestres,
doentes, frutos do demônio, da pomba gira e por aí vai uma infinidade de rótulos
pra lá de amargos. A gente foge de casa como forma de autodefesa, negação e
ausência de um horizonte. Mas tudo bem, não dá pra colocar toda a nossa infelicidade
na conta dos outros.
Os pais perdem seus filhos
para o mundo quando os assistem fazendo as malas para partir sem antes ter
aquela conversinha bem simples “te aceito como você é”, com direito a beijinho
na testa pra selar o amor incondicional que, nas entrelinhas, quer dizer: tamu
junto!
Todos os dias jovens desembarcam nos grandes
centros como Rio e São Paulo para experimentarem o novo, para sentirem um ar de
liberdade nos pulmões, pra baterem no peito “agora eu sou o dono da minha
própria vida”, poder visitar camas diferentes e se apaixonarem por alguém do
mesmo sexo sem que isso lhes custem a paz de espírito. O problema é que na
bagagem trazem muita ilusão, projeções de carreiras na novela das oito, a falsa
ideia de que será descoberto por um head
hunter na fila do Bob’s, a ingenuidade de que vai construir um império num
emprego que mal paga o aluguel, e de quebra ver a praia de Ipanema ou a estonteante
Oscar Freire da janela do quarto. Quando a ficha cai, já se passaram anos de
sonhos roubados.
Algumas pessoas vão ter
sucesso no trabalho, outras no amor, poucas as que serão bem sucedidas nos dois
quesitos, mas as que receberam uma educação com grandes valores terão o
discernimento para ver a vida com olhos de águia, vão sobrevoar sob esse mar de
ilusões. Vão estar no mundo sem ser do mundo. Quem já tiver essa receita que me
mande por inbox.
Muitas gerações apodreceram
sem ter o apoio da família, muitos gays foram assassinados e a maior parte
viveu trancada no guarda roupas visitando os guetos, o mundo underground, batendo cartões em saunas,
vivenciando o sexo proibido e voltando para a cama de suas esposas – tudo isso
porque um dia lá atrás os pais decidiram não tocar no assunto “sexualidade”.
E os vistos como rebeldes
perante a sociedade saíram em campo em busca de espaço assumindo a própria
personalidade, levantando bandeiras nas paradas gays marcando território da
mesma forma como fizeram os Bandeirantes com o Brasil. Aquela travesti ou a
bicha velha barriguda que os próprios gays têm ojeriza foram as pessoas que, no
passado, deram a cara pra bater vislumbrando uma sociedade mais justa e livre.
Graças a eles a homossexualidade deixou de ser vista como um câncer, mas a luta
ainda não terminou, existe uma linhagem de Cristãos que odeiam os gays.
Cristão... Ódio... Louco isso, não? Façamos a nossa parte, oremos por eles.
Voltando para o vagão onde
dois jovens desmiuçam o comportamento humano, é perceptível, pela conversa
deles, que os gays continuam surtando porque estão sem o suporte da família que
insiste em achar que bancar o filho longe de casa é o suficiente. Estão sem o
apoio da sociedade que continua formatada nos padrões ultrapassados e, também,
sem um modelo de vida pra se espelharem. Reinventar a vida é o máximo, mas até
onde somos capazes de fazer isso sem perder a conexão com as outras pessoas,
sem se sentir um peixe fora d’água?
As pessoas estão perdidas,
sem um Norte, sem saber que direção tomar porque foram programadas para gostar
do sexo oposto, casar-se com um padre no meio dizendo amém, tornar-se, pai, avô
- dar continuidade ao que chamamos de seguir a cartilha – ou, fazer o dever de
casa. Não se sentem merecedoras de amor e continuam repetindo os padrões das
gerações anteriores. Ficam amargas, apontando a vida sexual do outro, julgando,
competindo, lutando contra a própria genética para se sentirem um pouco mais
atraentes e terem a atenção que foi economizada pelos pais.
É duro ter que assumir, mas a vida gay se
resume em apenas um curto período de tempo que vai dos 19 aos 29 anos. E se
você se entupir de anabolizantes e tratamentos caríssimos, dá até pra estender
um pouquinho mais. O problema é saber a hora de pendurar as chuteiras. Estamos
todos com as pernas bambas temendo a nova fase como se fôssemos para a cadeira
elétrica. Afinal, ser velho e gay... Credo! Nossa sociedade egocentrista não
tem espaço pra esse tipo de gente. (ironia).
E então se prosseguem os
surtos: circuitos de festas na Europa, roupas ainda mais justas, cabelos com
cortes mais ousados, tudo pra parecer mais jovem, como resposta inconsciente do
“eu quero ser o assunto”, vivendo a vida como adolescentes forever tentando fazer parte de uma “época” que não lhes pertence
mais. O próprio grupo da nova geração rejeita a entrada deles: vaza. E, Ao
invés de aproveitarem Mykonos, pagam
micos, se expõem ao ridículo forçando a barra e, muitas vezes, se endividando
em nome da vaidade só pra sair bem na foto. Estão todos mantendo a angústia da
perseguição, sempre atrás de algo que não sabem explicar – e terminam sozinhos
e insatisfeitos. Isso vale pra todo mundo, inclusive pra mim.
Amadurecimento é sadio e faz parte. Construir uma
família está na essência do ser humano, seja ele avô, tia, sobrinho, irmã,
marido, esposa; criar um animal, ter dois pais, duas mães, ou uma mãe solteira
que será a nossa guerreira... Ninguém tem o direito de interferir no amor que
reina num lar.
Liberando ou não o casamento gay, as pessoas vão
morar juntas assim mesmo, vão ser felizes e dar um tapa de luva na sociedade
hipócrita que vive com seus relacionamentos assinados em papéis que embrulham o
pão de amanhã. E para a nossa esperança, vai uma conscientização dos pais em
instruírem seus filhos com valores que não precisam de firma reconhecida em
cartório.
Bruno de Abreu
Rangel
Um comentário:
Heheheheheh ri muito
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