terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Tudo o que a gente já sabe...


Tudo o que a gente já sabe...

Não precisamos esperar a virada do ano pra saber o que vai acontecer em nossas vidas. Independente da cor que usarmos, de onde iremos celebrar a grande festa, do valor da champanhe que brindarmos, ou da companhia que estará ao nosso lado...

... A gente já sabe que o ano seguinte será como todos os outros, mas com novas chances de aprendizado.

A gente não precisa fazer o mapa astral para descobrir que o silêncio da morte irá acontecer e alguém bem próximo de nós irá nos deixar dessa vida; que um amor nos decepcionará; que um amigo irá se apaixonar pelo nosso amor e que nossa paixão pode se tornar num grande amigo.

A gente não precisa invadir a privacidade de alguém, bisbilhotar o celular, xeretar os e-mails, pra chegar à conclusão que uma pessoa, por mais fiel que seja, terá sempre algo que não saibamos. E que, certamente, iremos interpretar ou julgar de forma irracional.

A gente já sabe que um relacionamento gay ou hétero são completamente iguais – seres humanos são diferentes: pode dar certo ou não.

A gente já tem a certeza de que o nosso emprego nunca será o suficiente para bancar os nossos gastos e que chefes existem, na maioria das vezes, para nos perseguir e nos massacrar, já que eles têm tempo suficiente para tal – salvo em raros casos.

A gente não precisa entrar no facebook para perceber que algumas pessoas mudam o status do relacionamento com a mesma facilidade que trocam de roupa, e que essa inconstância não é culpa de ninguém, faz parte da sociedade descartável em que vivemos. E que amor não se exige, se cativa.

A gente já tem a certeza de que aquele que despreza alguém por nós, mais tarde acabará nos desprezando – essa nunca falha.

A gente já sabe que metade das pessoas com que convivemos suga a nossa energia, ficam incomodadas se estamos felizes e que, poucas ou quase raras, são generosas conosco. E que generosidade não se aprende, nem se conquista. Ela nasce com a pessoa.

A gente não precisa fazer 80 anos para entender que o nosso corpo anda em direção à velhice e que não importa o número de plásticas, as horas incontáveis na academia, as dietas milagrosas. A única certeza é que a cada minuto nossas células caminham em direção ao sentido contrário da juventude. E se somos belos, lindos, ricos, famosos, mártires hoje, amanhã diremos que fomos tudo isso – Apenas diremos, não fará a menor diferença.

A gente já imagina que todas as pessoas são ruins, até que se prove o contrário; que alguém irá nos magoar ou dizer algo sem hesitar em pedir desculpas; que o nosso irmão pode agir como um “asshole” e um desconhecido qualquer ter atitudes benevolentes com a maior das boas intenções, sem esperar nada em troca.

A gente já sabe que vai chorar um rio de lágrimas quando perceber que passou a vida inteira lutando por algo que não conquistamos – e que não adianta culpar os outros pelas nossas derrotas, o mundo não deixa de girar para chorarmos as nossas mágoas.

A gente não precisa ir numa cartomante para saber que uma doença irá nos pegar de surpresa e que iremos sobreviver a ela da forma mais intrépida possível, segurando as mãos em qualquer coisa que chamamos de fé, ou de alguém que chamamos de amigo.

A gente não precisa ficar olhando o extrato bancário para ter a certeza de que um dia o dinheiro vai faltar e que a gente vai depender da ajuda de alguém, e que ser ajudado não é indigno, nem mesmo motivo de se sentir humilhado. Quem oferece uma mão é tão necessitado quanto à pessoa que a segura.

A gente sabe de muita coisa, ou muita coisa a gente acha que já sabe. A verdade é que não sabemos de absolutamente nada. A gente tem uma leve desconfiança ou receio dos acontecimentos e das pessoas.

O que pouca gente sabe é que felicidade é segurar nas mãos de alguém, contando os dedos, dar um beijo na testa, piscar os olhos e perguntar-lhe:

“Como foi o seu dia?”


E não precisa esperar o ano seguinte para se comprometer com um mundo de promessas se não entendermos o verdadeiro significado da vida, do que é viver um dia de cada vez.


Bruno de Abreu Rangel


Feliz Natal e um ótimo Ano Novo!

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Pagando multas



Pagando multas

Será que todo fim de relacionamento é uma dívida a ser paga?

Certa vez, pegando um trem intermunicipal na Itália, me confundi no instante de adquirir as passagens que eram emitidas através de uma urna eletrônica. Quando dentro do vagão, a oficial que usava um uniforme semelhante ao dos fascistas, me cobrou uma multa de 100 euros porque eu havia adquirido o ticket errado. Tentei me explicar, mas ela foi irredutível.

Em seguida, ela continuou o seu trabalho e notou que quase 30% daquele vagão enfervilhado de americanos, alemães, armênios, holandeses, cometeram o mesmo erro que eu e não foram nem ao menos, incomodados. Mas por quê? Estaria eu sendo alvo de preconceito simplesmente porque usava a camisa do Brasil?

Como quem não pensa duas vezes levantei-me e fiz o que qualquer nacionalista com o orgulho ferido faria – abri discussão com a oficial na frente de todos que, pela expressão das faces, pareciam estar do meu lado. A oficial não hesitou e respondeu ríspida:

- Se você entende italiano o suficiente para me desafiar saberia comprar o bilhete corretamente, se quisesse. Todos os outros turistas mal entendem o que eu digo, e caso queria levar isso adiante podemos discutir o assunto no departamento de segurança da Trenitália.

Sei bem qual é o tratamento para estrangeiros que afrontam as autoridades. Enfiei o rabo entre as pernas e entendi a mensagem.

Algumas vezes na vida, por mais que pensamos fazer a coisa certa, estamos fadados ao julgamento e consequentemente, a pagar multas. E não adianta pensar que a vida é injusta, ficar remoendo a situação, persistir na teimosia. É assim que as coisas funcionam, de erros, acertos – e pagamento de multas. É o preço da felicidade.

Na nossa vida amorosa também é assim. Na maioria das vezes imaginamos que estamos fazendo o que devia ser feito e quando menos esperamos, recebemos desilusão em troca. Pagamos todos os nossos pecados quando decidimos juntar as trouxas para viver com alguém. A vida a dois não é nada fácil até descobrirmos que tudo é uma questão de viver a sequência lógica: paixão, romance, amor, rotina, desencanto – fim de namoro e no final, a conta a ser paga. Será mesmo que todo namoro é como um jantar em que você saboreia, degusta cada sabor, se alimenta e no final tudo o que resta é uma conta a ser paga? Qual o valor da comida saborosa?

Infelizmente o que fazemos é esperar que a digestão se faça e se transforme em algo repugnante. Não devia ser assim. Deveríamos aprender a amar, incondicionalmente, sem medo de erros e acertos. Só o amor materno experimenta essa dádiva.

A maioria das pessoas acredita que quando saímos de um relacionamento adquirimos mais experiência. Mentira. Puro equívoco - pagamos mais multas. De cada fim de namoro levamos uma pitada a mais de rancor, remorso, insegurança, medo de se apaixonar novamente, arrependimento. É claro que levamos coisas boas também, mas fazemos o mesmo que a comida saborosa: transformamos em algo ruim e damos descarga.

Ainda somos muito ignorantes para entender o peso e o significado das coisas
Cada relacionamento é novo, é uma oportunidade de recomeçar, fazer tudo diferente, reinventar o que não funcionou, sem receios. Precisamos entender que a nossa caminhada é individual e temos que parar de mendigar por companhia e acreditar menos na monogamia possessiva.

Ninguém pertence a ninguém.

Pedro não pertence a Rafael. Pedro está em um relacionamento sério com Rafael, como o próprio facebook apresenta. É o mesmo que pensar que o nosso superior no trabalho é o nosso chefe. Ele não é nosso chefe, ele “está nosso chefe”. Amanhã é outro dia e quando a Terra gira ninguém é capaz de deter as tramas do destino.

O segredo da vida está em compreender a nossa missão, ser capaz de amar sem exigir demais das pessoas, sermos mais tolerantes. Seres humanos erram, e a culpa não é de ninguém.

Algumas pessoas cruzarão o nosso caminho com o mesmo intuito da oficial da Trenitália, e só nos resta agradecer pelo aprendizado. Se não deu certo. Sente, converse, não dê “piti”. Seja homem para assumir seus erros e pagar a multa, caso seja necessário. O perdão existe pra isso. E bola pra frente!

Bruno de Abreu Rangel