Agora que o verão passou, todos querem namorar.
Imagem ilustrativa do filme “Paraísos Artificiais”.
Acabou a lua
de mel com o verão.
Apesar de ser
a estação do sex appeal já estávamos
fartos de suar feito porcos e ter que ir à praia pegar câncer de pele pra
provar ao mundo que curtimos a vida. Graças ao bom Pai, as chuvas deram sinal
de vida, as temperaturas ficaram amenas e o nível do Cantareira subiu -
inversamente proporcional ao nível das boates, que, diga-se de passagem, estão
lá no chão. Onde foram parar os partidões, os lindos, “ricos e famosos”, que
coloriam as baladas?
Parece que recolheram
o tapete vermelho, desligaram os holofotes, as cortinas se fecharam e o
espetáculo terminou. Todos os personagens voltaram pra vida real onde se tem
contas pra pagar, uma pilha de roupas pra lavar, e uma série de questões
pessoais pra colocar em dia. Cada um com seus problemas. Bom, isso até o ano
que vem, quando começa tudo de novo: academia de Segunda a Segunda; frango
grelhado e batata doce (manhã, tarde e noite); oito horas de sono
cronometradas, ciclo de anabolizantes que a pessoa jura de pé junto nunca
tomar; Whey Protein, cookie de Whey Protein, bolo de chocolate com
cenoura (de Whey Protein); praia todo
final de semana; filtro solar; filtro do Instragram...
Todos no circuito do mata leão – mordida de pescoço – parede.
Como tudo tem
tempo de validade... O que acontece quando a festa acaba? Qual o preço que
pagamos por um dia no paraíso artificial?
O outono é
pra poucos. Inicia-se a época do recolhimento: as pessoas ficam mais caseiras,
sensíveis; um tanto quanto inibidas, já não vão à padaria quase nuas; o frango
grelhado vira Mcdonalds (a dieta entra em greve por tempo indeterminado); os
cinemas ficam mais disputados por pombinhos felizes; os aplicativos de pegação
bombam de perfis do tipo “querendo algo sério” e os restaurantes, recheados de
casais apaixonados desejando um amor pra vida toda que, em outras palavras,
significa: me distraia até o próximo verão? As relações, nos dias de hoje, não
se sustentam por muitas estações.
Viver sozinho
é duro. Passamos a vida toda sendo despistados por convenções, datas comemorativas,
eventos que se repetem, fatos irrelevantes que vão e vem. E, quando nada de
novo acontece, pensamos que talvez seja a hora de ter uma companhia. Mas,
diferente do que muitos pensam, relacionamento não é algo tão fácil que você
cria um perfil no Grindr e bingo:
encontrei a tampa da minha panela. Não funciona assim.
A busca
incessante pela pessoa ideal virou caso de polícia. Hoje ninguém se permite
estar com alguém sem antes fazer uma breve investigação sobre os seus passos, seguindo
a linha do “Eu sei o que você fez no verão passado”. E, se após essa etapa,
todos os itens da lista dos desejos não forem atendidos: tô fora. Esse já ficou
com duas pessoas na academia, não serve. Aquele gosta de Beyoncè, o outro é
cabelereiro, o fulano mora na Zona Norte, o ciclano não tem todos os gominhos
da barriga, próximo!
Dia desses
presenciei um rapaz tentando puxar assunto com um bonitão numa dessas casas de
suco que encontramos a cada esquina de Ipanema. Perguntava, pisando em ovos, se
ele saberia indicar um bom lugar pra sair naquela noite de Terça Feira e sua
resposta foi curta e grossa: joga no Google.
E virou o rosto. Senti vergonha pelos dois: um por ter sido vítima de um mal
educado estúpido, e do outro por ter criado um mundo em volta da sua
arrogância, sendo impossibilitado de se permitir ao imprevisível. Perdeu, em
algum momento de sua existência, o senso de humor da época em que uma cantada
nos tirava um sorrisinho no canto da boca. O amor pode acontecer onde, quando e
com quem a gente menos espera.
Precisamos
ficar mais relaxados, parar de entrar na paranoia de que o primeiro encontro é
uma entrevista de emprego. Não existe mais aquela inocência de sair com um
bonitinho e ver no que vai dar. O que aconteceu com o “vamos caminhar na praia
e dar uns beijos”? Estamos aprisionados na síndrome do casamento (a pessoa acaba
de conhecer e já quer saber se é pra casar). Daí rola aquela dança das
cadeiras: cinco minutos pra cada um e terminam no zero a zero.
E assim seguem a vida como se estivessem numa
eterna boate, circulando pela pista de dança, flertando aos montes, se “esbarrando”
com todos os tipos de pessoas, tendo conversas superficiais que não dizem nada,
e voltando para suas casas com uma impressão de que algo está faltando. Até
mesmo os bem-sucedidos, que tiveram retorno na carreira profissional, que
esbanjam um saldo na conta bancária e conseguiram custear uma série de produtos
que transformou o corpo... Entram e saem com a sensação de estarem sozinhos. Apesar
de levarmos a vida como se a juventude fosse eterna, o tic tac do relógio nos
faz lembrar que ninguém está ficando mais novo. Quando a onda da bala passa, um
dia de boate pode equivaler a cem anos de solidão.
Vamos
combinar, a night não está na sua
melhor fase; os amigos mais próximos estão ocupados com a própria felicidade;
as redes sociais já estão dando preguiça (um bando de solitários se auto
boicotando, sendo forçados a acreditar que um milhão de curtidas equivale a uma
noite de amor no mundo real); a TV anda de mal a pior: 3.242 canais – e nada que
nos prenda a atenção. Isso não nos soa familiar? Muitas opções, muitas escolhas
e nenhum xeque-mate.
Não há nada
de errado em sair com os amigos pra curtir uma boa música. A questão,
definitivamente, não é estar na boate, mas fazer parte dela, ser mais um
figurante que lota a pista de dança sem fazer nenhuma diferença na vida de
alguém, ou pra si mesmo. Desperdiçar todas as energias com o excesso, passar
todo tempo ocioso encarando o suor de pessoas que a gente mal conhece, se
esquivando de um Sábado sem grandes acontecimentos, temendo cair num marasmo e
bater de frente com o silêncio. Às vezes, solidão é simplesmente o estado natural
das coisas e como uma tempestade, ela vem e passa.
Bruno de Abreu Rangel
Amem, brother.
ResponderExcluirParabéns, Bruno!
ResponderExcluirAcredito que devemos cuidar de nós mesmos, sem muito individualismo, hipocrisia ou solidão. Estar preparado para saber e perceber que estar só, em algumas situações, é legal.
E que amor, aquele grande amor, pode estar no metrô, no restaurante cheio ou no volta despretensiosa do shopping.
Vou ler os outros textos!
Dança das cadeiras, conseguiu resumir exatamente o que está acontecendo. Quando esse pessoal vai acordar? Muita futilidade e pouco conteúdo.
ResponderExcluirÉ Bruno me parece essa ser a realidade de vcs paulistas acostumados com todas as festas, com milhões de opções por fim de semana. O que acaba tirando o prazer do inédito e da surpresa. O que não acontece com nós do interior no sul do Brasil. Aqui as festas não são megas, mas quem realmente se propor a conhecer alguem consegue. Acho que aqui as pessoas são mais simples sem ser presas a tantas tendências e exigências de como agir de como ser que regem a todos que moram numa grande cidade. Essa necessidade de querer ser e parecer cosmopolita antenado cria uma espectativa muito difícil de ser superada já que a exigência é muito grande acabando por deixar todos a procura do impossível perfeito ser.
ResponderExcluirBruno, parabéns pelo texto!
ResponderExcluirPrimeira vez que vejo alguém escrever de forma que nos toca e escreve sem a pretensão de ser um intelectual sabe tudo. Perfeito!!!!!!!!!!!
ResponderExcluirBruno, já te conheci pessoalmente e notei a pessoa incrivel que tu é, agora que descobri o seu blog e li dois textos com os quais me identifiquei profundamente, percebo que o que conheci foi apenas a ponta do iceberg que é a sua pessoa.
ResponderExcluirParabéns! e agora lerei seus textos com mais frequência.
Att,
Alguém de Beagá
Cada um com seus problemas e cada um que fale por si e não por todos, é muita arrogância e prepotência achar que todo mundo gosta das mesmas coisas e faz as mesmas coisas, seja lá qual for a época do ano.
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